quarta-feira, agosto 27, 2003

A gente se acostuma a tudo. Se acostuma a mudar de lar, a sair daquela aconchegante casa que lembra os melhores dias da nossa infância e ir para um apartamento cinza e frio e longe. Se acostuma a viver apertado para pagar a faculdade e, quando se forma, se acostuma a não arrumar emprego e a aceitar qualquer porcaria em troca de uma merreca no final do mês para pagar as contas. Se acostuma com as pessoas que te olham de cara feia sem motivo, a viver dusputando migalhas e atenção com os irmãos, e até a sentir dor. Se acostuma a levar tombos, ao próprio jeito estabanado e esquecido. Se acostuma a perder um grande amor, aprende a viver sem ele, mesmo sentindo um vazio eterno dentro do peito. A gente se acostuma ao vazio, e ao frio gelado do sul, e ao calor intenso do norte. Se acostuma a fingir que não viu e que não ouviu, se acostuma a correr do carro, pra pegar o ônibus e pra fugir da barata. Se acostuma a perder pessoas que morrem de uma hora pra outra de forma trágica, ou lentamente de doença. Se acostuma a ir ao correio, depois se acostuma a ler emails e a deletar os spans. Se acostuma ao telefone que não toca quando estamos ansiosos, ou ao barulho infernal dele quando precisamos dormir. Acostumamos a acordar cedo para trabalhar, a dormir tarde para estudar e a passar horas presos em engarrafamentos. A gente se acostuma a tudo, e eu não queria, não devia...

(ouvindo Dandy Warhols - Welcome to the monkey house (e não é que é bom mesmo?))

Nenhum comentário: